CRÔNICA DA SEMANA de Carlito Lima “JANGADEIROS ALAGOANOS”

Carlito Lima

JANGADEIROS ALAGOANOS

Há poucos anos, antes da pandemia, recebi em Maceió, três casais amigos; colegas de turma, aos quais tenho estima de irmãos desde que cursamos a Academia Militar das Agulhas Negras. Fomos a um passeio à Foz do Rio São Francisco. Acomodamo-nos numa confortável van que recolhia outros turistas. Ao passar pela Rua Jangadeiros Alagoanos, provoquei o guia perguntando o porquê do no nome daquela rua. Ele prontamente respondeu que era uma homenagem à Escola de Samba Jangadeiros Alagoanos daquele bairro; Pajuçara. Não me contive, pedi licença ao guia e educadamente afirmei que ele estava equivocado e de microfone em punho contei a história:

– Em 1922 no Centenário da Independência do Brasil aconteceram muitas comemorações na capital do país. O Rio de Janeiro se engalanou e construiu uma Exposição do Centenário da Independência. Naquela época os jornais e revistas do Sul chegavam com mais de uma semana no Nordeste.

Um pescador, conhecido líder, de nome Umbelino, ousado e festeiro, leu uma reportagem sobre a programação do Centenário no Rio de Janeiro e lhe deu uma vontade enorme de conhecer a capital da República. Passou três dias matutando como faria aquela viagem, até que surgiu a ideia de viajar pelo mar em sua jangada de seis paus e uma vela. Experiente mestre fez os cálculos, concluiu que a jangada aguentaria navegar cerca de 2.000 km pela costa. Convidou três pescadores, homens rústicos que enfrentavam o mar diariamente antes do sol amanhecer. Fizeram algumas reuniões de planejamento na casa de Umbelino. A notícia se espalhou pelos homens de beira de cais, pelo bairro boêmio de Jaraguá e afinal toda cidade. Alguns amigos se prontificaram a ajudar.

No dia 27 de agosto, dia de Nossa Senhora dos Prazeres, padroeira da cidade de Maceió a jangada de seis paus, uma vela, sem algum instrumento de navegação, nem uma bússola sequer, partiu da enseada de Jaraguá levando os quatros jangadeiros corajosos. Houve um clima de festa: muitas jangadas, barcos, acompanharam com foguetório a jangada INDEPENDÊNCIA mar adentro rumo ao Rio de Janeiro para festejar o centenário da Independência na capital do país. Rumaram pelo o litoral Sul. No dia 6 de setembro a jangada atracou em Salvador, como havia planejado. Reabasteceram e seguiram a viagem prevista para trinta dias. Acontece que o litoral baiano estava brabo, em certo ponto o temporal foi tamanho que os jangadeiros foram jogados ao mar. Perderam toda provisão, roupas e a preciosa vela. Nadando os quatros heróis puxaram a jangada até a praia. Sorte que havia um povoado; os baianos ajudaram como puderam aos jangadeiros, até uma nova vela ofereceram. Os experientes pescadores esperaram bom tempo, retornaram a viagem. Acontece que o mar e o céu não estavam para brincadeira, vieram mais outros temporais atrapalhando a navegação. Eles chegaram a Porto Seguro no início de outubro, o planejamento já havia furado. Enfrentaram o mar novamente com algumas paradas em povoados e cidades costeiras. Até que no dia 2 de dezembro entraram na Baía da Guanabara depois de 98 dias de viagem. Desembarcaram no cais do Arsenal da Marinha, com muito aplauso a população já esperava os aventureiros. No dia seguinte, colocaram a jangada num caminhão e levaram os quatro jangadeiros alagoanos ao Palácio do Catete, onde foram recebidos pelo presidente Arthur Bernardes. A jangada ficou no Rio de Janeiro, era a principal atração do Pavilhão de Exposições das Festas do Centenário da Independência. Os jornais do sul noticiaram o fato largamente, transformando os jangadeiros alagoanos em heróis nacionais. A jangada depois foi doada ao Museu Histórico Nacional. Os jangadeiros retornaram a Maceió a bordo de um navio do Lloyd Brasileiro. Foram recebidos com muita festa na enseada de Jaraguá. Muitas homenagens, dentre elas a Rua do Horizonte passou a se denominar Rua Jangadeiros Alagoanos. E em 1972 foi fundada a Escola de Samba Jangadeiros Alagoanos.

Depois de minha exposição fui aplaudido pelos turistas, entreguei o microfone ao guia. Durante a viagem, toda vez que ele prestava informação, me perguntava se estava certo. Pelo menos, um dia, tive a honra de ser guia turístico, graças a brava história dos destemidos Jangadeiros Alagoanos.

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