CRÔNICA de Carlito Lima “Eduardo Bomfim”

Autor: Carlito Lima é escritor alagoano, engenheiro civil, produtor cultural e boêmio.

Certo vez recebi um telefonema do amigo Eduardo Bomfim marcando um encontro num café. Para surpresa ele me convidou a ser seu assessor durante o mandato de vereador em Maceió. Me senti honrado mas, ponderei, ele ser do Partido Comunista do Brasil e eu um liberal, embora tivesse simpatia com alguns propósitos da esquerda, como a justiça social, eu era à favor da livre iniciativa, do empreendedorismo e além do mais, um Capitão do Exército, embora reformado. O Partido não iria me rejeitar? Naquela calma e poder de persuasão, falou que, antes de tudo, ele era um democrata, aceitava ideias contraditórias, gostava de argumentar suas razões. Já havia consultado o Partido que aprovou meu nome, um técnico como assessor. O convite fora feito, por eu ter exercido vários cargos na Prefeitura e ser conhecedor dos problemas e das soluções da cidade, queria realizar um mandato participativo, ouvir o povo, fazer um trabalho em direção aos mais carentes, principalmente a cultura popular. Aceitei imediatamente, faria aquele trabalho junto ao Bomfim até como voluntário, pois ele era um dos políticos alagoanos da maior credibilidade.

Desse dia em diante começamos a planejar e viabilizar projetos, ele me dava carta branca para o trabalho técnico e principalmente ouvir a população em seus anseios da comunidade.

Problemas nos bairros, eu fotografava e dava entrada direto nas secretarias, cobrava, eles resolviam os problemas. Gratificante e inesquecível trabalhar com o Bomfim. Todos os dias nos encontrávamos para avaliação de trabalho e projetos em andamento. Foi iniciativa de Eduardo Bomfim um projeto cultural de maior sucesso na cidade. Transformamos a Rua da Praia em Rua Shopping às sextas-feiras. Fechávamos a rua aos carros, as lojas ficavam abertas e muita apresentação cultural nas ruas. O Prefeito Ronaldo Lessa deu total apoio. Eu conversei e convenci com todos os moradores e donos de loja da rua da Praia. Até hoje o projeto Rua da Praia – Rua Shopping é lembrado. Eduardo certa vez mandou que a assessoria escrevesse um rascunho da Lei de Incentivo à Cultura. Em pouco tempo, adaptamos as leis de outros municípios, a Lei da Cultura foi aprovada na Câmara de Vereadores. Mas nunca regulamentada. Uma lei tão importante numa cidade tão rica em cultura popular e tão pobre para manter essa cultura. Foi muito trabalho durante o mandato que fazíamos com convicção.

Eduardo Bomfim foi figura de destaque da geração inquieta dos anos 60/70, que testemunhou e participou da revolução dos costumes, da cultura, da luta contra preconceitos do mundo. Foi a vitória da humanização e da minoria oprimida, principalmente as mulheres.

Conheci Eduardo Bomfim nos anos 70, quando ele liderava a Sociedade de Direitos Humanos em Alagoas. Minha admiração pelo político Eduardo Bomfim vem dessa época. Figura das mais dignificantes deste Estado, além de ser um idealista, era um homem de princípios. Eduardo Bomfim foi Deputado Constituinte, participou da elaboração da Constituição de 1988. Considerado um dos mais atuante parlamentares, os jornalistas de Brasília escolheram Eduardo Bomfim como Constituinte Nota 10 pelo seu trabalho, incluindo na Constituição cláusulas em defesa do povo, dos menos favorecidos.

Bomfim mostrou, quando presidiu a Fundação Cultural Cidade de Maceió, que tinha tino administrativo e visão do futuro, encaminhando diversos projeto ao Ministério da Cultura. Fez uma administração marcante para a cultura maceioense. O que mais se precisa nessa Brasil é de gente honesta como o Bomfim. O resto se resolverá.

Mas, foi uma pena, essa semana Alagoas ficou de luto, recebi com profunda tristeza a notícia da morte de Eduardo Bomfim. Deu uma dor no peito pelo amigo que se foi, a figura humana que Alagoas perdeu. Resta apenas citar os versos do poeta John Donne que diz mais ou menos assim:

“Nenhum homem é uma ilha, isolado em si mesmo; todos são parte do continente, uma parte de um todo. Se um torrão de terra for levado pelas águas até o mar, a Europa ficará diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar de teus amigos ou o teu próprio; a morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti”.

Ouço os sinos dobrando pelo Bomfim, pelos amigos, por Alagoas. Por todos nós. Difícil um homem do porte ético, político e intelectual de Eduardo Bomfim. Até mais, amigo velho!

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